Ninguém poderia imaginar quanta felicidade existia naquela casinha feia perdida no fim do mundo.
Os dias amanheciam sempre sorridentes e contavam com nossos sorrisos também. Ela abrigava uma bela parceria de dois seres que se amavam muito.
A dor física, quando existia, era curada com ternura, pura e simplesmente.
Nossas mãos estavam sempre impregnadas de energia curativa, advinda do sentimento bom que nos unia.
A vida era bela! Na quinta-essência da expressão...
No céu, as nuvens nos presenteavam todos os dias, com novas obras de arte, moldadas com a competência que só a natureza possui.
Era mágico desvendar cada desenho feito por elas, trocar palpites e impressões até chegarmos ao consenso, que nos levava constantemente a crer que haviam desenhado o amor, mais uma vez.
E quando alguma nuvem atrevida, tornava-se escura e se intrometia entre as outras, simplesmente entrávamos em casa, para não vermos a tristeza no céu, já que ela não existia em nossos corações.
E aconchegados nos braços um do outro, apenas ouvíamos a felicidade.
Há quem não saiba, mas a felicidade pode ser ouvida, e tem uma quantidade incontável de sons que a identificam.
Às vezes o som da felicidade era representado pelas batidas do seu coração, que eu ouvia embevecida, sabendo que ele batia por mim e não tinha porque duvidar. Outras vezes, a melodia de um passarinho lá fora, que certamente nos destinava o seu mavioso canto, pela alegria de presenciar através de nós, o verdadeiro amor. Havia também o murmúrio das águas do rio, parecendo um cantarolar suave de espíritos bons que nos rodeavam. Eram sons da felicidade para mim, para nós...
Amor... é a palavra mágica! Tudo na vida, por pior que seja, pode ser resolvido e suportado com alegria, resignação e coragem, desde que possamos sentir a presença do amor.
Mas os seres humanos, infelizmente, têm a tendência doentia de materializar o amor, como se ele fosse a peça de um jogo de xadrez, que só quem tem, pode sair vencedor... ou uma jóia preciosa à qual nem todos têm acesso... ou um reflexo no espelho, que se mostra imagens imperfeitas, estas não teriam direito ao amor... Oh, céus! Quanta falta de discernimento! Mesmo entre seres humanos que acreditam serem sábios.
O amor não exige nada, não tem requisitos básicos, ele acontece ou não, e ponto.
Mas nós dois sabíamos exatamente o que era o amor, porque nunca lutamos contra ele e o partilhávamos com alegria de viver.
Ele era uma presença constante entre nós, impalpável sim, mas concreta em cada gesto, em cada olhar de ternura ou compreensão, em cada minuto da nossa vida.
Lá fora, na placidez do rio, podíamos ver refletida a placidez dos nossos corações. Paz... é irmã gêmea do amor, que não se define, sente-se e desde que seja sentido, sempre irradia muita paz!
E os dias passavam lentos, morosamente, porque os sentimentos não se atrelam ao tempo, apenas à intensidade de cada momento vivido.
Eu não sei precisar quando tudo isso aconteceu, mas sei que aconteceu e me lembro bem do lugar... de você... lembro do seu sorriso, do seu olhar, da sua fala mansa e pausada, que tinha sempre a conotação de brisa refrescante, pois jamais foi causadora de um mau momento, pelo contrário, suas palavras sempre me faziam grande bem.
E sinto arrepios de saudade quando essas lembranças invadem o meu pensamento.
Mas em algum ponto delas, tudo se torna escuro e eu não consigo mais ver nem lembrar nada... como se apagassem as luzes do túnel do tempo... para onde você foi? O que aconteceu depois? Não sei...
Só sei que de repente, um desses anjos displicentes que nos rodeiam pela vida, alguém de quem eu gosto muito, me deu essa imagem de presente e ao olhá-la, invadiu minha mente num turbilhão, as lembranças de toda essa felicidade que eu vivi ao seu lado, algum dia, em algum lugar...
Mas hoje... tudo que eu tenho é essa saudade estranha que embala meus dias numa rede de serena nostalgia, e que eu chamo de: "saudade de nada".
Mas eu sei que é saudade de você, entretanto... onde estará?