Dentro de mim há guardado
Lembranças do meu passado
Bons tempos da minha vida
Usava tranças compridas
E a franja na testa caída
Maciça e escorregadia
Que a cor dos olhos escondia
Os meus sonhos, e as fantasias
Arquitectava um porvir
Brincava, e sempre a sorrir
Saudável, e com muita energia
Corria pelas salinas, até o findar do dia
Quando os sinos da capela
Anunciavam a Ave-Maria
Sem direito a questionar
Hora do banho, e do jantar
E da casa, não mais saía
Moída e exausta, após toda a correria
Atirava-me nos braços, de quem muito me queria
E com muito amor me envolvia
Ela, a minha avozinha Maria
Cantava, contava-me histórias
E aos poucos, eu adormecia.
Por vezes me vem á revolta
Por ter-se rompido, à porta
Lançando-me as chamas do medo
Partindo os galhos do arvoredo
Quebrando toda a esperança
Os meus anseios, as sapatilhas, a dança
Ainda bailam em minha lembrança
Nos atalhos da minha infância.