Dois seres que se amaram no passado,
Não puderam o sonho realizar,
E viveram distantes, separados...
Mas o destino um dia os fez juntar,
E o antigo sonho ali foi relembrado,
Imaginando os dois serem casados.
Pior que aquele nunca existiria...
O tal palpite que rondou o momento:
Sendo seus filhos, moços, belos, fortes,
Poderiam se unir em casamento...
Daquele amor antigo e com magia,
Seriam eles, novos passaportes.
O tempo se incumbiu de todo o resto,
Os jovens se renderam à história,
E se entregaram à missão cruel...
Sem perceberem a isenção de glória,
Sem esboçarem o menor protesto,
E cada um fazendo o seu papel.
A primavera mal tinha chegado...
No céu de outubro via-se esperança,
Um novo tempo estava a começar...
Eram compassos para aquela dança,
Que o tal destino havia preparado,
Depois de longos anos se esperar.
Pura emoção no evento promissor!
Tudo indicava que daria certo,
O tal mergulho ao fim do trampolim...
Mesmo no espaço escuro e tão deserto,
Porque era um casamento por amor,
Porém, do amor que um dia teve fim.
Ela, por tanto tempo ouviu a história,
Contada sob o brilho de um olhar,
Que entristecido via que baixava,
E a dívida assumiu sem hesitar.
Julgava-se a própria moratória,
Do amor que a vida, aos poucos, apagava.
Se ele pensava o mesmo, ela não soube.
Nunca teve coragem de indagar,
O simples pensamento, hostilizava,
Do amor da mãe, um dia, macular...
Se limitou à parte que lhe coube,
Achando que o tal sonho ela salvava.
Assim seguiram juntos para o altar,
Numa missão mais triste que feliz,
Manhã ensolarada, mês de outubro...
Era tão diferente o que ela quis!
Porém não soube a esfinge desvendar,
E o seu sonho tombou, contrito e rubro.
Na igreja, disse "sim"... nunca entendeu.
Só lembra do seu peito a sufocar,
Em meio àquela multidão festeira,
Tomada do mais cáustico pesar...
E mesmo assim, sorrindo recebeu,
Chuva de arroz e flor de laranjeira.
O mundo não parou, como pensava,
E a dor aos poucos ela viu brotar,
No peito torturado pela mágoa...
Uma notícia boa ver chegar:
Às vezes, na janela ela esperava,
Sem se conter, os olhos rasos d'água...
Guardava o seu segredo, sua tortura,
Com medo do futuro e do passado,
Que tudo e todos eram inimigos...
Sua esperança havia desertado,
Do campo onde sonhou colher ventura,
E nem ao menos pode ter amigos.
Quase menina, sem saber do que,
Morria tudo que passava ao lado,
Não demorou para compreender:
Seu casamento havia fracassado...
Era tão simples de saber porque,
Se aquilo fosse amor... melhor morrer!
Os meses foram séculos vividos,
E foram três que ela viveu assim,
Presa a um fardo tão cruel, de amor.
Porém, o seu fadário teve fim,
E resgatada por entes queridos,
Se despediu daquela insana dor.
Levou consigo o fruto precioso,
A vida que pulsava no seu ventre,
Que estava livre de ser espancada.
Ouvia alguém que lhe dizia:- Entre...
E no jardim de luz, esplendoroso,
Gozou sua liberdade conquistada.
Mas liberdade não é solução,
Para chagas que se abrem, doloridas,
Que nem o tempo consegue curar,
E seguem junto para outras vidas...
A lenda que ditou seu coração,
Diz não poder jamais ressucitar:
Sonho de amor que um dia alguém viveu.
A cada um, a vida tem que dar,
O sagrado direito de se ter,
O sonho novo que a alma pleitear.
O que passou, já não é mais, morreu...
Ninguém no mundo pode reaver.